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Liderança Tecnológica em Startups de IA: Lições de 12 Anos Construindo Equipes

Reflexões sobre os desafios e aprendizados de liderar equipes técnicas em startups de IA, desde bancos de investimento até healthtechs, e como construir culturas de inovação sustentável.

Reflexões sobre os desafios e aprendizados de liderar equipes técnicas em startups de IA, desde bancos de investimento até healthtechs, e como construir culturas de inovação sustentável.

Depois de 12 anos liderando equipes de data science e IA em diversos setores - de bancos de investimento a hospitais, de startups early-stage até scale-ups - quero compartilhar algumas reflexões sobre o que aprendi sobre liderança tecnológica no ecossistema brasileiro de IA.

O Desafio Único das Startups de IA

Liderar uma startup de IA é fundamentalmente diferente de liderar uma startup tradicional. Não é apenas sobre product-market fit ou escalabilidade - é sobre navegar em um campo onde o próprio conhecimento está evoluindo exponencialmente.

A Curva de Aprendizado Perpétua

Na WingsAI, nossa fábrica de produtos verticais de IA, enfrentamos constantemente o desafio de:

  • Manter a equipe atualizada com os últimos avanços (GPT-4, LLaMA, Claude, etc.)
  • Balancear exploração vs. execução - quando apostar em tecnologias emergentes vs. entregar produtos estáveis
  • Gerenciar expectativas de stakeholders que muitas vezes superestimam ou subestimam o potencial da IA

Construindo Equipes de Alta Performance

1. Contratação: Além das Habilidades Técnicas

Nos primeiros anos da minha carreira, focava demais em competência técnica pura. Hoje, priorizo:

Curiosidade Intelectual

Prefiro um desenvolvedor curioso que aprende rápido do que um especialista inflexível.

Comunicação Clara

IA é interdisciplinar. Quem não consegue explicar conceitos complexos para não-técnicos limita o crescimento da equipe.

Resiliência a Falhas

Em IA, 80% dos experimentos falham. Precisamos de pessoas que veem falha como aprendizado, não como fracasso.

2. Estrutura Organizacional Híbrida

Descobri que equipes de IA performam melhor em estruturas híbridas:

  • Squads autônomos para produtos específicos (SmartFin, RHR, BeloPrato)
  • Centro de excelência compartilhado para pesquisa e infraestrutura
  • Rotação regular entre projetos para evitar silos de conhecimento

3. Ritmo Sustentável vs. Pressão de Mercado

O mercado de IA brasileiro está aquecido. VCs pressionam por crescimento acelerado, clientes querem soluções ontem. Mas aprendi que ritmo sustentável vence corrida de 100 metros.

Implementamos:

  • 20% time para exploração pessoal (inspirado no Google)
  • Semanas de aprendizado trimestrais focadas em novas tecnologias
  • Post-mortems sem culpa para extrair aprendizados de falhas

Lições dos Diferentes Setores

Fintech (Banco de Investimento)

Aprendizado: Regulamentação como diferencial competitivo

  • Sistemas de IA precisam ser auditáveis e explicáveis
  • Documentação rigorosa não é burocracia, é vantagem competitiva
  • Compliance pode acelerar, não retardar, a inovação

Healthtech (Hospitais)

Aprendizado: Impacto humano como motivador supremo

  • Equipes performam melhor quando veem o impacto direto no paciente
  • Qualidade de dados é literalmente questão de vida ou morte
  • Interdisciplinaridade é obrigatória, não opcional

Consumer Tech (Produtos WingsAI)

Aprendizado: Simplicidade na superfície, complexidade embaixo

  • UX intuitiva é mais difícil em IA do que em apps tradicionais
  • Usuários não precisam entender IA, mas precisam confiar nela
  • Feedback loops rápidos são essenciais para ML em produção

Os Maiores Erros que Cometi

1. Superestimar Maturidade da Equipe

Em 2022, assumi que toda a equipe conseguiria migrar rapidamente para LLMs. Resultado: 3 meses de produtividade baixa até nivelarmos todos.

Solução: Sempre começar com uma “avaliação de fluência” antes de grandes mudanças tecnológicas.

2. Não Investir em Infraestrutura Cedo

MLOps não é glamoroso, mas é fundamental. Passei 6 meses refatorando sistemas que poderiam ter sido bem arquitetados desde o início.

Solução: 30% do tempo técnico da equipe sempre dedicado a infraestrutura e tooling.

3. Não Documentar Decisões Arquiteturais

IA evolui rápido. Decisões que faziam sentido há 6 meses podem parecer absurdas hoje. Sem documentação, repetimos erros.

Solução: ADRs (Architecture Decision Records) obrigatórios para qualquer decisão técnica significativa.

O Futuro da Liderança em IA

Vejo três tendências emergentes:

1. Liderança Distribuída

Com IA generativa, desenvolvedores júniors podem ter produtividade de sêniores. Isso democratiza contribuições e exige novo estilo de liderança.

2. Ética como Core Competency

Não é mais suficiente ser tecnicamente excelente. Líderes precisam navegar questões éticas complexas sobre bias, privacidade e impacto social.

3. Educação Contínua Sistematizada

O half-life do conhecimento em IA está caindo. Líderes precisam institucionalizar o aprendizado, não deixar na responsabilidade individual.

Construindo o Ecossistema Brasileiro

Como consultor do CBO e membro de várias comunidades tech, vejo minha responsabilidade além da WingsAI:

  • Mentoria de outros CTOs e tech leads
  • Compartilhamento de best practices através de palestras e artigos
  • Advocacy por políticas públicas que favoreçam inovação responsável
  • Ponte entre academia e indústria para acelerar transferência de conhecimento

Reflexão Final

Liderar em IA não é sobre ser o mais inteligente da sala - é sobre criar condições para que toda a sala seja mais inteligente. É sobre construir sistemas, cultura e pessoas que podem adaptar e evoluir junto com a tecnologia.

O Brasil tem potencial para ser protagonista global em IA. Mas isso só acontecerá se tivermos líderes que entendem que tecnologia é apenas uma ferramenta. O verdadeiro diferencial está nas pessoas e na cultura que construímos ao redor dela.

Nos próximos anos, meu foco continuará sendo formar a próxima geração de líderes tecnológicos brasileiros. Porque o futuro da IA no Brasil não depende apenas de algoritmos melhores - depende de líderes melhores.


João Victor Dias é co-fundador e CTO da WingsAI, onde lidera o desenvolvimento de produtos verticais de IA. Com experiência em bancos de investimento, hospitais e startups, já formou mais de 50 profissionais de dados e IA. Atualmente é doutorando em Ciências Médicas Oftalmológicas e consultor tecnológico do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

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